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Gonzaga, a volta do Baião

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O cantor Luiz Gonzaga foi destaque na primeira edição da revista Veja, na seção Música, em 11 de setembro de 1968. Confira abaixo:

Luís Gonzaga: 2 milhões de discos vendidos. Os Beatles vão vender mais?

“O baião tem um quê que as outras danças não têm.” — “Baião”, de Luís Gonzaga e Humberto Teixeira, 1945. Luís Gonzaga deu uma gargalhada quando soube que os Beatles iam gravar “Asa Branca”, baião feito por ele e Humberto Teixeira em 1948. “Agora é que eu quero ver se os Beatles vendem mesmo”, comentou. “Minha gravação vendeu mais de 2 milhões de discos.” Luís Gonzaga, 56 anos, fala grosso com sua voz nordestina, não porque os Beatles gravaram uma música sua, nem porque os jornais o trazem para as manchetes como papa de um culto de repente ressuscitado, o culto do baião. A segurança de Luís Gonzaga vem de que, com mais de 2 mil músicas gravadas, êle já perdeu até a conta dos milhões de discos vendidos até hoje. No fim do mês estará na praça o seu 21º LP, com seu eterno parceiro Humberto Teixeira, ex-deputado federal pelo Ceará e Rei do Baião. Como os vinte anteriores, o LP venderá bem: em 1945, as prensas da RCA Victor (onde grava há 28 anos) chegaram a trabalhar só para êle, o que provocou protestos do presidente da firma.

Instrumento de tango — Luís Gonzaga do Nascimento nasceu filho de sanfoneiro na Fazenda Caiçara, no sopé da serra do Araripe, Pernambuco, fronteira com o Ceará. Com doze anos ganhou o seu primeiro cachê para animar com a sanfona um casamento no povoado. Além do cachê ganhou os elogios do Mestre Duda, sanfoneiro de fama na região. Convocado pelo Exército, o jovem sanfoneiro veio para o Rio em 1932, época da Revolução Paulista. Dando baixa, Luís Gonzaga se viu obrigado a tocar na zona portuária e em cabarés do Mangue, bairro da prostituição. Mas sua grande aspiração era tocar no programa de calouros de Ari Barroso, o compositor que êle mais admirava. O sarcástico Ari, porém, mostrou mais espanto do que admiração ao ver entrar no palco aquêle jovem nordestino carregando uma pesada harmônica. “Isso é instrumento de tango. Não venha dizer que no Nordeste se faz música com isso.” Mas Luís Gonzaga tocou até o fim, classificando-se em primeiro lugar. A música, “Vira e Mexe”, seria depois o seu primeiro disco. E, com o primeiro disco, veio também o apelido de “Lua”, pela sua cara redonda de lua cheia. Cinco anos depois dessa gravação, Luís Gonzaga conhecia Humberto Teixeira.

Baião de Dois — O que Luís Gonzaga e Humberto Teixeira fizeram, a partir de 1945, foi trazer para a cidade (e vestir com roupas de cidade) uma velha música nordestina. O baião original era entremeado de falas, e isso dificultava o ritmo. “Estilizamos as principais características, traduzimos os modismos do Nordeste e tornamos a música mais dançável”, diz Humberto Teixeira. Pesquisadores e folcloristas, como Câmara Cascudo, já haviam notado uma tendência de dança no baião. E ainda em 1842 o Padre Miguel do Sacramento, do Recife, escrevia: “Em batizados e casamentos havia o costume de tocar minuetos rasteiros, em geral arrematados com um baião, dança ainda não considerada imoral como hoje”. Foi no ano em que Gonzaga e Teixeira se conheceram, num programa de auditório da Rádio Nacional (atraía mais gente do que hoje os programas de auditório da TV), que os Quatro Ases e Um Coringa inauguraram a Época do Baião, com a música da dupla, “Baião” — verdadeira receita do nôvo ritmo (“Eu vou mostrá pra vocês/ Como se dança o baião…”). A Época do Baião durou quase cinco anos. “Juàzeiro” foi gravado até no Japão. Entre baiões, rojões e toadas, a dupla Lua — Teixeira compôs mais de trinta sucessos: “Mangaratiba”, “Que Nem Jiló”, “No Meu Pé de Serra”, “Paraíba” (que entrou para os dicionários no sentido de “mulher-macho”), “Asa Branca”.

A volta do baião — Em seu último LP, Wilson Simonal incluiu dois baiões: “Paraíba”, de Luís Gonzaga, e “Sá Marina”, do jovem compositor carioca Antonio Adolfo. “Sá Marina”, em compacto, está nas paradas de sucesso do Rio e de São Paulo; nos Estados Unidos, Sérgio Mendes prepara-se para gravá-la. “Luís Gonzaga é super da pesada”, diz Antonio Adolfo, 21 anos. “Todo mundo está fazendo hoje o que êle fazia, só a estilização é diferente”. Caetano Veloso confessa: “Minhas influências musicais vêm de João Gilberto e do iê-iê-iê, passando por Luís Gonzaga”. Outro do grupo tropicalista, Gilberto Gil, admite também a influência de Gonzaga, “o primeiro fenômeno musical que me tocou”. Traços de baião marcam suas composições, bem como as de Geraldo Vandré (“Disparada”), de Milton Nascimento (“Travessia”) e de Edu Lôbo (“Ponteio”, que para Luís Gonzaga é um exemplo perfeito do xaxado). Foram essas músicas que trouxeram Luís Gonzaga de volta para a televisão: todos os domingos, à tarde, êle dá duas horas de baião pela TV Continental, do Rio. Seu programa na Rádio Mauá, “Noite Impecável”, é o líder de audiência no horário: “É um programa como eu gosto, para o povo mesmo”. Em 1950, Luís Gonzaga compôs, com um nôvo parceiro, Zé Dantas, “A volta da Asa Branca”. Hoje, sôbre a volta da “Asa Branca”, nos braços dos Beatles, êle diz: “Os meninos inglêses têm muito sentimento e não avacalham a música. A toada dêles parece bastante com as coisas do Nordeste. Até as gaitas de fole lembram a nossa sanfona…”

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